Conheci a Maria por motivos profissionais há uns anos atrás, arquitecta de profissão e florista por vocação, era assim que ela se apresentava, começamos por trocar contactos profissionais, mais tarde a amizade falou mais alto, e começamos a falar quase todos os dias.
Era uma miúda bonita sem ser exuberante, simpática, sempre disponível para ajudar, com uns olhos tão azuis que envergonhavam o céu, e dona de um sorriso cativante.
Quando nos conhecemos a Maria já era casada, e ansiava a chegada do tão desejado bebé.
O que finalmente aconteceu, lembro-me que entrou pelo meu escritório dentro como um vendaval de Primavera e tão eufórica que nem conseguia falar, a felicidade finalmente estava completa, e os olhos azuis brilhavam mais que nunca.
Abracei-a quase institivamente, desejei-lhe felicidades e choramos juntas…
Mas a felicidade durou pouco… no terceiro mês de gravidez, numa consulta de rotina o médico detectou algo num dos seios e deu a conhecer o veredicto: Ela tinha um quisto que necessitava de ser removido, mas teria de se sujeitar a radiografias e TAC, o que não podia acontecer com ela grávida, as soluções seriam o aborto para poder tratar o seio, ou continuar com a gravidez e ficar sujeita que o quisto se tornasse em algo mais grave e já fosse tarde demais.
Desta vez não me visitou… telefonou! Não chorava, mas senti que ela precisava falar e no fim do dia fui ter com ela. Mas já não adiantou a visita, a Maria já tinha decidido levar a gravidez até ao fim, e tratar-se depois… Nem os meus argumentos, nem as lágrimas do marido a demoveram de tamanha loucura.
Vi pela primeira vez tristeza no olhar daquela menina/mulher que tomou uma decisão que mudaria para sempre a sua vida.
Passaram-se os meses, parecia ter esquecido aquele “detalhe” , mas eu sabia que passava as noites chorando…
Até que na Primavera de 2010 chegou prematura a pequena Vitória, franzina com pouco mais de 1,8 kg, mas com garra de viver… e depressa foi para casa.
A partir daí começou o calvário da minha amiga, entre exames, quimioterapia, e operações, ela ainda tinha forças para tratar da sua pequena Vitória.
Até que… neste Verão foi-lhe removido o segundo seio, e a batalha recomeçou…
Cada vez mais fraca, mas sempre sorrindo ela dizia não ter medo de morrer, que a filha seria o legado que ela deixaria ao marido que tanto amava…
Na véspera de Natal fui visitá-la ao hospital e levar-lhe flores que ela tanto amava, já pouco restava da minha amiga, os olhos fundos já não me pareciam azuis, mas cor de céu em dia de tempestade, os lábios já não conseguiram brindar-me com aquele sorriso lindo, e falamos pouco…
Apertou-me a mão e vi as lágrimas a escorrerem pela face pálida, abracei aquele corpo esquelético, e ela disse-me ao ouvido: Não me arrependo de nada, nunca desistas dos teus sonhos…. E choramos abraçadas como naquele dia em que me comunicou que estava grávida, só que desta vez as lágrimas eram de tristeza e agonia. Despedi-me prometendo voltar hoje.
A Maria deixou-nos ontem ao fim da tarde, não esperou pela minha visita, nem pelo 3º aniversário da sua pequena/grande Vitória…
Um dia… tenho a certeza que ainda nos encontraremos para lá da linha do horizonte, naquele local especial onde só vai quem amou muito.
Descansa em paz minha amiga!
Não te posso prometer que não vou chorar, mas prometo que vou tentar sorrir, como tu sempre fazias.