Certa madrugada fria irei de cabelos soltos ver como crescem os lírios. Quero saber como crescem simples, belos e perfeitos!Ao abandono nos campos...

terça-feira, dezembro 29, 2009

Cansada


Estou cansada. De dias cinzentos a esconder o sol. De sorrisos forçados à custa de uma mentira maior. De conversas paralelas onde ninguém se ouve. Todos se queixam e ninguém tem razão. Estou triste, de uma tristeza miudinha que nada convém abraçar – porque a máscara teima em não cair e a sinceridade é um bicho mal aceite por todos – porque o medo não se vai embora ao primeiro arrepio – e porque estou cansada. Cansada, só isso. E depois é uma roda-viva: todos a tentar fugir a uma rotina, cada um a puxar por si. Todos emaranhados em problemas menores que ao passar das horas crescem mais um bocadinho. É a vida, que se há-de fazer? Esperar? Gritar? Ou fugir? Nada disso. É tempo de arregaçar as mangas e avançar para o desconhecido. Esperam-se mais máscaras, fingimentos, mentiras, crises existenciais, choros e paranóias. Porque ninguém se afigura feliz com o pouco ou o muito que tem. Não importa. Somos insatisfeitos por natureza, inconsoláveis, insaciáveis. E procuramos no fundo do poço a salvação para os nossos pecados. Ainda que sejamos demasiado orgulhosos para dizer: ajuda-me. A vida corre, todos os dias, para uma encruzilhada sem regresso. E lá vamos nós, sozinhos, quase de rastos se for preciso, mas sempre de sorriso aberto aos outros. E se perguntarem se está tudo bem, puxamos da nossa melhor figura (a máscara essencial dos dias maus) e respondemos com um olhar vago e um aperto de mão ou um beijinho supostamente feliz. Porque é assim que tem de ser. Porque os outros só nos conhecem o lado bom, conveniente, solar. E esquecem-se que por detrás desta máscara de aparências ilusórias está uma pessoa. Não interessa quem é. Uma pessoa, dentro de uma realidade construída a partir de sonhos e desilusões. E, às vezes, os sonhos não chegam a ser sonhos e as desilusões têm de ser varridas para debaixo do tapete. Para vivermos todos em harmonia, de olhos pequeninos e míopes, longe da crueldade e da curiosidade mórbida alheia. Às vezes é preciso fazer de conta. Hoje não me apetece fazer de conta. Apetece-me, isso sim, dizer que não. Deitar a máscara no lixo. Chorar se for preciso e pedir ajuda. Quem se diz orgulhoso acabará perdido em nenhures, à espera de poder voltar atrás. Do alto do meu orgulho, parece-me que cheguei ao fim: aquele sítio onde alguém já esteve, onde todos se perderam, aquele lugar - distante o suficiente para ninguém falar sobre ele, o buraco que ninguém recorda e toda a gente finge esquecer. Cheguei ao fim, sozinha, e tenho vontade de voltar ao princípio. Sem vergonha que me levem pela mão. Sabendo que o novo caminho está algures à minha espera. À nossa espera. Porque, sem danças e com (muitos) erros - assim se faz a vida de toda a gente.

2 comentários:

Unknown disse...

Bom texto, que 2010 seja um ano em que te sintas menos cansada!

Bjs

s disse...

Esse cansaço acho que é a minha doença incurável, cheio de máscaras, sorrisos artificiais, mentiras bonitas, amigos falsos, enfim.
Talvez seja influências do dia 1 de Abril e acreditar que sou um engano neste mundo e não consigo compreender as atitudes das pessoas.
mas que fazer, acreditar em dias melhores e talvez encontre uma pessoa que pense do mesmo modo, e somos dois a tentar compreender este mundo.

Parabéns pelo texto.

beijinhos.